sábado, 26 de março de 2011

ESTÉTICA


        A prática do judô traz muita satisfação: a sensação agradável que os exercícios trazem aos músculos e nervos, a satisfação de aprender a dominar os movimentos e a alegria de vencer as competições. Não menos importante é a beleza e o prazer de ter um desempenho elegante e ver os outros também o tendo. Essa é a essência do aspecto estético do judô.


* texto extraído do livro Judô Kodokan – Jigoro Kano – Ed. Cultrix
 TREINAMENTO ÉTICO




        Vamos ver agora como a compreensão do princípio da máxima eficiência se transforma em treinamento ético.
        Existem pessoas nervosas por natureza e que ficam raivosas por qualquer motivo. O judô pode ajudá-las a se controlar. Através do treinamento, rapidamente elas descobrem que a raiva é um desperdício de energia e que só exerce efeitos negativos sobre elas mesmas e os outros.
        O treinamento de judô também é muito benéfico para quem não tem autoconfiança por já ter cometido erros. O judô nos ensina a buscar a melhor atitude a ser tomada, não importando as circunstâncias, e ajuda-nos a compreender que a preocupação é um desperdício de energia. Paradoxalmente, uma pessoa que cometeu um erro e outra no auge do sucesso estão exatamente na mesma posição. Ambas precisam decidir o que farão a seguir, precisam escolher o caminho que devem tomar no futuro. Os ensinamentos do judô dão a todos os indivíduos o mesmo potencial para o sucesso, tirando-os da letargia e do desânimo, e levando-os a um estado de atividade vigorosa.
        Outro tipo de pessoa que pode se beneficiar com a prática do judô é o descontente crônico, que imediatamente culpa os outros por suas próprias falhas. Esse tipo descobre que o estado negativo de sua mente vai contra o princípio da eficiência máxima e que viver de acordo com esse princípio é a chave para atingir um estado mental confiante.   


* texto extraído do livro Judô Kodokan – Jigoro Kano – Ed. Cultrix
TREINAMENTO DA MENTE



        Tanto o kata como o randori são formas de treinamento mental, mas, dos dois, o randori é o mais eficiente.
        No randori, você deve buscar as fraquezas do oponente e estar pronto para atacar com todos os recursos disponíveis no momento em que encontrar uma brecha, mas sem violar as regras do judô. A prática do randori faz com que os alunos fiquem mais interessados, sinceros, cuidadosos, cautelosos e determinados para a ação. Ao mesmo tempo, eles aprendem a analisar e tomar decisões rápidas e a agir imediatamente, pois, tanto no ataque quanto na defesa, no randori não há lugar para a indecisão.
        No randori, nunca se sabe que técnica o oponente irá usar em seguida, então o praticante fica o tempo todo em guarda. Estar alerta se torna uma segunda natureza. O praticante também adquire boa postura e autoconfiança por saber que é capaz de lidar com qualquer eventualidade. Os poderes de atenção, observação, imaginação, raciocínio e julgamento aumentam, e esses são atributos úteis tanto na vida diária como no dojo.
        Praticar o randori é investigar as relações complexas, mentais e físicas, que existem entre os lutadores. Centenas de valiosas lições são extraídas desse estudo.
         No randori, aprendemos a usar o princípio da máxima eficiência mesmo quando podemos facilmente vencer o oponente. De fato, é muito mais admirável vencer o oponente com a técnica apropriada do que com a força bruta. Essa lição é útil no dia-a-dia: o aluno percebe que uma persuasão apoiada na lógica firme acaba sendo mais eficiente que o uso da coerção.
        Outro princípio do randori é aplicar apenas a quantidade certa de força – nunca de mais, nunca de menos. Todos nós conhecemos pessoas que não conseguiram o que queriam porque não utilizaram a quantidade certa do esforço que era necessário. Ou eles não chegaram aonde deveriam, ou não souberam quando parar.
        No randori, às vezes nos defrontamos com um oponente que está fora de si em seu desejo de vencer. Somos treinados para não resistir diretamente com força, mas a jogar com o oponente até que sua fúria e sua energia fiquem esgotadas, e só então atacamos. Essa lição é útil quando encontramos na vida diária uma pessoa desse tipo. Como nenhum argumento racional funcionará com alguém assim, tudo o que podemos fazer é esperar até que ela se acalme.
        Esses são apenas alguns exemplos de como o randori pode contribuir no treinamento intelectual das mentes jovens.


 * texto extraído do livro Judô Kodokan – Jigoro Kano – Ed. Cultrix
DOIS MÉTODOS DE TREINAMENTO



        Até agora falei de dois aspectos principais no treinamento do judô: o desenvolvimento do corpo e o treinamento das formas de ataque e defesa. Os treinamentos fundamentais para esses dois propósitos são: 1) o kata e 2) o randori.
        O kata, palavra que significa “forma”, é um sistema de movimentos preestabelecidos que ensina os fundamentos do ataque e da defesa. O kata inclui técnicas para bater, chutar, apunhalar e várias outras, além de usar os movimentos de arremessar e segurar o oponente, que também são praticados no randori. Essas técnicas são praticadas apenas no kata, porque somente nesse sistema os movimentos são preestabelecidos e cada participante sabe o que o outro fará.
        Randori significa “prática livre”. Os parceiros se encontram e aproximam-se um do outro como se estivessem em uma verdadeira competição. Eles podem fazer arremessos, imobilizações, estrangulamentos e também aplicar chaves de juntas, mas não podem golpear ou chutar, ou usar técnicas que são apropriadas apenas no combate real. As condições principais do randori são: os participantes devem tomar o cuidado para não machucar uns aos outros e devem seguir a etiqueta do judô, que é obrigatória para eles obterem o máximo benefício do randori.
        O randori pode ser praticado como treinamento dos métodos de ataque e defesa ou como educação física. Em ambos os casos, todos os movimentos são feitos de acordo com o princípio da máxima eficiência. Se o objetivo é o treinamento de ataque e defesa, é suficiente que haja concentração na execução apropriada das técnicas. Mas, além disso, o randori é ideal para desenvolver o cuidado com o físico, pois envolve todas as partes do corpo e, diferentemente das ginásticas, todos os seus movimentos tem um propósito e são executados com espírito. O objetivo desse treinamento físico organizado e constante é controlar com perfeição a mente e o corpo e preparar a pessoa para reagir em qualquer emergência ou ataque, acidental ou intencional.


* texto extraído do livro Judô Kodokan – Jigoro Kano – Ed. Cultrix
O JUDÔ COMO EDUCAÇÃO FÍSICA



        Como tive grande sucesso em aplicar o princípio da máxima eficiência nas técnicas de ataque e defesa, eu me perguntei se o mesmo princípio poderia ser aplicado na melhoria da saúde, ou seja, na educação física.
        Qual é o objetivo da educação física? Já ouvimos muitas opiniões sobre isso. Depois de pensar demoradamente sobre essa questão e conversar com várias pessoas que conheciam o assunto, concluí que seu objetivo é tornar o corpo forte e saudável, e, ao mesmo tempo, formar o caráter através da disciplina mental e moral. Tendo assim esclarecido o propósito da educação física, vamos ver até que ponto os seus métodos comuns estão em conformidade com o princípio da eficiência máxima.
        As formas como as pessoas treinam seu corpo são muitas e variadas, mas essas formas sempre entram em duas categorias: esporte e ginástica. É difícil falar de maneira generalizada sobre esportes porque existem muitos tipos diferentes, mas eles compartilham uma característica importante: são de natureza competitiva. Seus objetivos originais não eram promover um desenvolvimento físico equilibrado e uma boa saúde. Inevitavelmente, o que acontece é que alguns músculos são utilizados em excesso, enquanto outros ficam esquecidos. Assim, às vezes o esporte pode causar um problema maior a diversas áreas do corpo. Como educação física, muitos esportes podem não receber uma nota alta – de fato, deveriam ser abandonados ou melhorados -, pois deixam de fazer um uso mais eficiente das energias mental e física, e impedem o progresso em relação à promoção da saúde, da força e da utilização do corpo.
        Por outro lado, a ginástica é muito boa como educação física. Sua prática não causa problemas para o corpo, em geral é benéfica para a saúde e promove o desenvolvimento equilibrado. Mesmo assim, a ginástica, como normalmente é praticada hoje em dia, falha em dois aspectos: interesse e utilidade.

       
      
         Há muitas maneiras de tornar a ginástica mais interessante para o público, mas uma que recomendo é que se pratique um grupo de exercícios que tentei desenvolver. Cada combinação de movimentos de membros, pescoço e tronco é baseada no princípio da máxima eficiência e representa uma ideia. Feitos em combinação, eles promovem de maneira eficaz um desenvolvimento físico e moral harmonioso. Outro grupo de exercícios que criei, o Seiryoku Zen’yo Kokumin Taiiku (Educação Física Nacional de Máxima Eficiência), também é praticado na Kodokan. Seus movimentos não só levam ao desenvolvimento físico equilibrado, mas também consistem em um treinamento dos princípios de ataque e de defesa.
        Para que seja realmente efetiva, a educação física deve ser baseada no princípio do uso eficiente das energias mental e física. Estou convencido de que os futuros avanços na educação física vão estar de acordo com esse princípio.    


* texto extraído do livro Judô Kodokan – Jigoro Kano – Ed. Cultrix
O JUDÔ FORA DO DOJO


        As competições no judô seguem o pensamento de que as lições ensinadas nos torneios devem ser aplicadas em treinamentos futuros e também na vida real. Vou falar dos cinco princípios básicos e mostrar resumidamente como eles funcionam.
        O primeiro diz que a pessoa deve prestar muita atenção no relacionamento entre ela mesma e o outro. Por exemplo, antes de executar um ataque, ela deve observar o peso, a constituição, os pontos fortes e o temperamento do oponente, e assim por diante. É necessário ainda ela estar consciente de suas próprias forças e fraquezas, e observar de forma crítica o ambiente a sua volta. Quando as competições eram ao ar livre, era necessário inspecionar a área a procura de pedras, valas, muros e outras coisas desse tipo. No dojo, devemos ter cuidado com as paredes, as pessoas e outros potenciais obstáculos. Se alguém observa cuidadosamente tudo ao seu redor, perceberá naturalmente a forma correta de derrotar seu oponente.
        O segundo ponto é tomar a dianteira. Quem pratica jogos de tabuleiro, como xadrez ou go (xadrez oriental), está familiarizado com a estratégia de fazer um movimento que induzirá o outro jogador a fazer determinada jogada. Esse conceito é claramente aplicável tanto ao judô quanto ao nosso cotidiano.
        De forma resumida, o terceiro ponto é: considere tudo, aja com decisão. A parte inicial da frase se relaciona ao primeiro ponto de que falamos acima, ou seja, é necessário avaliar cuidadosamente seu adversário antes de executar a técnica. Feito isso, o conselho dado na segunda parte da frase vem naturalmente. Agir com decisão significa agir sem hesitação e sem pensar duas vezes.
        Depois de os três princípios mostrarem como agir, o quarto adverte você sobre quando parar. Isso pode ser dito de maneira bem simples: quando um ponto predeterminado tiver sido alcançado, é hora de parar a aplicação da técnica, ou o que estiver sendo feito.
        O quinto e o último ponto é a própria essência do judô. Está contido na frase: “Caminhe um único caminho, não ficando nem vaidoso com a vitória nem desanimado com a derrota, sem se esquecer da cautela quando tudo está calmo nem ficando com medo quando o perigo ameaça.” Nessa frase está a advertência de que, se deixarmos o sucesso nos conduzir, a derrota inevitavelmente virá, mesmo depois de uma vitória. Também quer dizer que devemos sempre estar preparados para um combate – mesmo imediatamente depois de ter conseguido uma vitória. Não importa se o ambiente em sua volta está calmo ou turbulento, você sempre deve explorar todos os meios que estiverem disponíveis para atingir seu propósito.
        O aluno de judô deve manter esses princípios em mente. Ele descobrirá que os benefícios são imensos quando os aplica no trabalho, na escola, no mundo político ou em qualquer outra área da sociedade.
        Em resumo, o judô é uma disciplina física e mental, e suas lições podem ser aplicadas na nossa vida diária. O princípio fundamental do judô, que governa todas as técnicas de ataque e defesa, é que, qualquer que seja o objetivo, ele é mais facilmente alcançado através do uso, com máxima eficiência, da mente e do corpo. O mesmo princípio aplicado em nossas atividades cotidianas leva a uma vida melhor e mais racional.
        O treinamento nas técnicas do judô não é única maneira de se atingir esse princípio universal, mas é como cheguei a compreendê-lo, e é o meio pelo qual eu tento ensinar aos outros.

        O princípio da máxima eficiência – se aplicado na arte de ataque e defesa ou usado para refinar e aperfeiçoar a vida diária – requer que haja, acima de tudo, ordem e harmonia entre as pessoas. E isso só pode ser obtido por meio do auxílio e da compreensão recíprocos. O resultado é o bem-estar e o benefício mútuo. A meta final da prática do judô é ensinar o respeito pelos princípios da eficiência máxima e do bem-estar mútuo. Através do judô, as pessoas alcançam, individual e coletivamente, seu estado espiritual mais elevado, ao mesmo tempo em que desenvolvem seus corpos e aprendem as artes de ataque e de defesa.


* texto extraído do livro Judô Kodokan – Jigoro Kano – Ed. Cultrix