sábado, 26 de março de 2011

O JUDÔ FORA DO DOJO


        As competições no judô seguem o pensamento de que as lições ensinadas nos torneios devem ser aplicadas em treinamentos futuros e também na vida real. Vou falar dos cinco princípios básicos e mostrar resumidamente como eles funcionam.
        O primeiro diz que a pessoa deve prestar muita atenção no relacionamento entre ela mesma e o outro. Por exemplo, antes de executar um ataque, ela deve observar o peso, a constituição, os pontos fortes e o temperamento do oponente, e assim por diante. É necessário ainda ela estar consciente de suas próprias forças e fraquezas, e observar de forma crítica o ambiente a sua volta. Quando as competições eram ao ar livre, era necessário inspecionar a área a procura de pedras, valas, muros e outras coisas desse tipo. No dojo, devemos ter cuidado com as paredes, as pessoas e outros potenciais obstáculos. Se alguém observa cuidadosamente tudo ao seu redor, perceberá naturalmente a forma correta de derrotar seu oponente.
        O segundo ponto é tomar a dianteira. Quem pratica jogos de tabuleiro, como xadrez ou go (xadrez oriental), está familiarizado com a estratégia de fazer um movimento que induzirá o outro jogador a fazer determinada jogada. Esse conceito é claramente aplicável tanto ao judô quanto ao nosso cotidiano.
        De forma resumida, o terceiro ponto é: considere tudo, aja com decisão. A parte inicial da frase se relaciona ao primeiro ponto de que falamos acima, ou seja, é necessário avaliar cuidadosamente seu adversário antes de executar a técnica. Feito isso, o conselho dado na segunda parte da frase vem naturalmente. Agir com decisão significa agir sem hesitação e sem pensar duas vezes.
        Depois de os três princípios mostrarem como agir, o quarto adverte você sobre quando parar. Isso pode ser dito de maneira bem simples: quando um ponto predeterminado tiver sido alcançado, é hora de parar a aplicação da técnica, ou o que estiver sendo feito.
        O quinto e o último ponto é a própria essência do judô. Está contido na frase: “Caminhe um único caminho, não ficando nem vaidoso com a vitória nem desanimado com a derrota, sem se esquecer da cautela quando tudo está calmo nem ficando com medo quando o perigo ameaça.” Nessa frase está a advertência de que, se deixarmos o sucesso nos conduzir, a derrota inevitavelmente virá, mesmo depois de uma vitória. Também quer dizer que devemos sempre estar preparados para um combate – mesmo imediatamente depois de ter conseguido uma vitória. Não importa se o ambiente em sua volta está calmo ou turbulento, você sempre deve explorar todos os meios que estiverem disponíveis para atingir seu propósito.
        O aluno de judô deve manter esses princípios em mente. Ele descobrirá que os benefícios são imensos quando os aplica no trabalho, na escola, no mundo político ou em qualquer outra área da sociedade.
        Em resumo, o judô é uma disciplina física e mental, e suas lições podem ser aplicadas na nossa vida diária. O princípio fundamental do judô, que governa todas as técnicas de ataque e defesa, é que, qualquer que seja o objetivo, ele é mais facilmente alcançado através do uso, com máxima eficiência, da mente e do corpo. O mesmo princípio aplicado em nossas atividades cotidianas leva a uma vida melhor e mais racional.
        O treinamento nas técnicas do judô não é única maneira de se atingir esse princípio universal, mas é como cheguei a compreendê-lo, e é o meio pelo qual eu tento ensinar aos outros.

        O princípio da máxima eficiência – se aplicado na arte de ataque e defesa ou usado para refinar e aperfeiçoar a vida diária – requer que haja, acima de tudo, ordem e harmonia entre as pessoas. E isso só pode ser obtido por meio do auxílio e da compreensão recíprocos. O resultado é o bem-estar e o benefício mútuo. A meta final da prática do judô é ensinar o respeito pelos princípios da eficiência máxima e do bem-estar mútuo. Através do judô, as pessoas alcançam, individual e coletivamente, seu estado espiritual mais elevado, ao mesmo tempo em que desenvolvem seus corpos e aprendem as artes de ataque e de defesa.


* texto extraído do livro Judô Kodokan – Jigoro Kano – Ed. Cultrix

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