De acordo com uma obra intitulada “Suikoden” (水滸伝, “Na Margem da Água”), escrita no começo da dinastia Ming (segunda metade do século XV, na China), o termo bugei – gei (芸), artes; bu (武), marcial, bélico – se referia ao uso de armas como arco, espada, lança, alabarda, machado, etc. O bujutsu – jutsu (術), técnicas - , por sua vez, significa “todas as técnicas necessárias para a luta”, aprendidas “pelo corpo”. Elas incluem, por exemplo, natação e equitação.
No Japão, após a chegada dos samurais ao poder, no período Kamakura (1192-1333), as práticas de combate começaram a ser classificadas. A prática de artes marciais como treinamento para combate real incluía as técnicas conhecidas pelo nome de bugei juhappan (武芸十八般, as 18 disciplinas de combate), reunindo todo o vasto repertório de combates com a espada, corpo a corpo, equitação, lança e assim por diante.
Essas práticas são a base do bujutsu, que permitiu às famílias de guerreiros se proteger das concorrentes. Cada uma desenvolveu técnicas próprias. Foi colocando em prática esses experimentos no campo de batalha que as escolas de combate, ryuha, foram criadas.
A prática do bujutsu era solitária, e sua transmissão restringia-se aos membros de uma elite da classe guerreira. Havia uma intenção por trás disso: proteger-se durante um conflito com outros guerreiros. Se as técnicas de luta fossem muito difundidas, seria fácil para os inimigos planejarem contra-ataques.
O conhecimento especial de todas as escolas particulares, ryu, está exclusivamente nas mãos do mestre corrente ou do fundador do estilo. Nota-se que a difusão dos estilos de bujutsu ryuha pelo Japão teve início quando os mestres começaram a viajar para testá-los contra outros. Isso permitiu a evolução das técnicas, que eram verificadas e aprimoradas.
O bujutsu requer profunda e sincera devoção. O treinamento era muito difícil, porque não existiam métodos unificados para transmissão de conhecimento, isto é, não havia uma forma específica ou pedagógica para ensinar. Era necessário que o discípulo desenvolvesse uma acuidade particular, olhando a movimentação, ação e formas de execução, até que pudesse imitar o que era observado e chegar à perfeição.
O bujutsu inclui o domínio de várias armas e técnicas desenvolvidas devido ao clima de incertezas, guerras e combates pelo qual passou o Japão. Naturalmente, compreende técnicas de confrontos com ou sem o uso de armadura. A prática do bujutsu incluía os exercícios kumitachi (組太刀), gekitô (撃刀), tachi uchi (太刀打) ou yoroi kumiuchi (鎧組打).
Os mestres de bujutsu experimentavam as técnicas de combate uns com os outros ao mesmo tempo em que empreendiam uma pesquisa pessoal das mais eficazes táticas baseadas nas experiências vividas através do combate.
Três documentos eram utilizados para a transmissão das técnicas do bujutsu aos discípulos: o kiri-gami (切紙, carta atestando o primeiro nível prático), inka (印可, certificado de controle da escola) e mokuroku (目録, índice que listava e descrevia as técnicas da escola) ou emokuroku (絵目録, índice de técnicas com ilustrações). O conteúdo desses documentos escritos pelo mestre representava, mais que os ensinamentos técnicos, o pensamento da escola desde a sua criação. Tais diretrizes deveriam ser seguidas assim como a técnica léxica.
O bujutsu foi uma evolução lógica da prática primitiva a que se dedicavam os guerreiros de antes do período Kamakura. As técnicas de combate usadas anteriormente, durante e depois do período Heian (794-1185) foram a expressão direta de um impulso destrutivo.
Em inúmeros casos e escolas estudadas, percebeu-se que a prática do bujutsu passava de mão em mão junto com a pesquisa espiritual. Foi o que permitiu encontrar o último nível técnico da arte. A maioria das escolas foi criada depois de algum sonho ou visão em que o fundador recebe uma iniciação técnica e espiritual.
Pode-se concluir que o bujutsu é o conjunto de técnicas de combate, as quais incluem um grande número de habilidades corporais focadas primeiramente na arte da guerra. Nesse contexto, a espiritualidade tinha um lugar especial e variava de acordo com o grau de habilidade e fé do praticante.
Para uma pesquisa mais refinada das técnicas de combate, que seja profunda e capaz de prever as reações do adversário, é necessário abrir-se. Com isso, pode-se ver que essa pesquisa espiritual está longe de ser desprezível.
* texto extraído do livro A Arte do Ninja - Entre ilusão e realidade - Kacem Zoughari -Editora JBC
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